sexta-feira, 25 de novembro de 2011

desabafo - meu e comigo

Quando decidi ser professor, sabia bem o que estava fazendo. Nunca ficaria rico, trabalharia horas a fio, inclusive aos fins de semana, sendo por isso frequentemente visitado pelo cansaço. Muitos foram os que me alertaram e até tentaram me persuadir: minha mãe, que me queria jornalista, meus amigos, que me queriam músico, compositor, escritor ou dono de boteco, a diretora da minha escola, que sabia bem do que dizia. Não alego, pois, ignorância, foi uma decisão absolutamente consciente. No momento em que marcava o xis no curso de Letras, o que eu fazia era, idealista que sou, ser sincero comigo, com aquilo que via (e que, teimoso, ainda vejo) como projeto de vida, no mais lírico dos sentidos.

Em meus três primeiros anos lecionando, vivi como quem vive um romance. Apaixonado pela carreira e pelos que faziam parte dela (colegas de trabalho e alunos, principalmente alunos), tive a convicção de ter escolhido bem. Acreditei ver ser possível educar para vida, estabelecendo relações mais que profissionais. São pessoas convivendo, eu repetia todos os dias, e pessoas se interferem. Acompanhei o crescimento de muita gente, de alguns tive orgulho - esses, os mesmos, eu sei, que se orgulham de mim -, por outros nutri esperança. Eu me via contribuindo e isso era bom.

Entretanto, veio o ano de 2011 e questionou tudo isso. Fui ofendido, dentro e fora de sala, algumas vezes. Todas por alunos por quem tive (já não posso dizer que tenho) um carinho enorme. Vi bons meninos e meninas mostrando-se qualquer coisa que não conheço e com a qual não concordo. Minha honestidade foi colocada à mesa, meu caráter também (e até, veja só, minha qualidade profissional, da qual tenho inabalável segurança - sei de tudo que fiz, sei de tudo que faço). Um considerável número de mentiras ao meu respeito divertiu alguns, a outros convenceu, sem direito de defesa, diga-se. Fraqueza minha, cedi. Não consegui deixar de me embrutecer. Eram pessoas de quem gostava, pessoas para quem dediquei momentos da minha vida, não queria vê-los de índole fraca, de vontade fraca, de postura fraca diante da vida.

Não consigo deixar de pensar que falhei com essas crianças, pois eu sei, sou corresponsável pela educação de todos eles. Mas não foi falta de esforço, talvez de traquejo, habilidade, mas não de esforço. Não consegui, me vendo coisificado e dispensado por já não ser útil, ajudar.

É claro que não falo aqui de uma população homogênea. Um bom número de moleques justifica os percalços, não por futuras aprovações neste ou naquele vestibular concorrido, mas por terem se mostrado humanos quando o entorno cobrava aspereza.

É um mundo difícil esse para aqueles que acreditam na educação, para os que acreditam nas pessoas, e em si. Este ano, que ainda guarda uma das suas, não duvido, me levou a inocência. Não reclamo. Aquela escolha feita, o xis no curso de Letras, a teimosia: foi tudo de caso pensado e eu não me traio. Nem desisto. Você, 2011, ano mais difícil, me ensinou que querermos o bem não faz com que ele entre em pauta, nem que seja bem quisto. Me ensinou que eu não tenho controle sobre as coisas que eu gostaria de ter e que, em boa parte dos casos, vai ser assim sempre e eu terei que conviver com isso. E isso é bom.

“...e ninguém, mas ninguém percebia que a sua raiva era um amor muito bem disfarçado...”